O Nascimento do Sentido de Tempo: Da Ordem Pré-reflexiva à Ordem Simbólica
Resumo
O tempo constitui-se como um dos organizadores da mente. Como se desenvolve o sentido do tempo desde as primeiras formações protomentais até à consciência do tempo? A perspetiva fenomenológica-existencialista do tempo, a dimensão cíclica e a temporalidade dos processos fisiológicos ligam-se à natureza rítmica da intercorporalidade precoce, dando origem a experiências só possíveis no decurso do tempo e que se vão organizando em unidades cada vez mais complexas. Exploram-se diversas dimensões da relação com o tempo — tempo cronológico, tempo subjetivo, temporalidade, temporalização, historicização e progressão. Os precursores do sentido de tempo organizam-se desde os níveis arcaicos de funcionamento psíquico, o corpo — palco dos fenómenos fisiológicos —, para as modalidades pré-verbais de comunicação e ordem simbólica que dão origem à consciência do tempo, destacando as primeiras contribuições de Freud e a obra de André Green. A psicopatologia é uma fonte privilegiada de observação indireta que pode auxiliar na recuperação do traçado de desenvolvimento do sentido do tempo. Da fenomenologia psicopatológica às similitudes entre a linguagem filosófica de Heidegger e o discurso psicanalítico de André Green, finalizamos com vinhetas clínicas provenientes de trabalho clínico com pacientes adultos, recorrendo aos conceitos de reverberação associativa, antecipação anunciadora, irradiação associativa e movimento.
Palavras-chave
tempo, sentido de tempo, fenomenologia, princípio da realidade, psicopatologia
Biografia Autor
Ana Mónica Dias
Mestre em Psicologia Clínica pela Universidade de Lisboa. Psicoterapeuta e Psicanalista; Membro Associado da Sociedade Portuguesa de Psicanálise (SPP) e da Associação Psicanalítica Internacional (IPA).
Referências
- Bion, W. R. (1967). Second Thoughts: Selected Papers on Psychoanalysis. Heinemann.
- Borges-Duarte, I. (2021). Cuidado e temporalidade. Em Cuidado e afectividade em Heidegger e na a análise existencial-fenomenológica (pp. 53–77). Editora Nau.
- Cabré, J. M. (2008). The psychoanalytic conception of trauma in Ferenczi and the question of temporality. The Americam Journal of Psychoanalysis, 68, 43–49. https://doi.org/10.1057/palgrave.ajp.3350051
- Civitarese, G. (2019). The concept of time in Bion ?s “A theory of thinking”. The International Journal of Psychoanalysis, 100(2), 182–205. https://doi.org/10.1080/00207578.2019.1570216
- Colarusso, C. A. (1987). The development of time sense: from object constancy to adolescence. Journal of the American Psychoanalytic Association, 35(1), 119–144. https://doi.org/10.1177/000306518703500106
- Dias, A. M. (2022). A Temporalidade em Psicanálise. Revista Portuguesa de Psicanálise, 42(2), 26–32. https://doi.org/10.51356/rpp.422a3
- Eliade, M. (1957). O sagrado e o profano. A essência das religiões. Livros do Brasil.
- Ferenczi, S. (1994). Stages in the development of the sense of reality. Em S. Ferenczi Further Contributions to the Theory and Technique of Psychoanalysis (pp. 366–378). Karnak Books. (Original publicado em 1913.)
- Ferenczi, S. (1994). The problem of acceptance of unpleasant ideas. Em S. Ferenczi Further Contributions to the Theory and Technique of Psychoanalysis (pp. 366–378). Karnak Books. (Original publicado em 1926.)
- Fischbein, J. E. (2017). Configurations of time, the body, and verbal communication: Temporality in patients who express their suffering through the body. The International Journal of Psychoanalysis, 98(2), 323–341. https://doi.org/10.1111/1745-8315.12583
- Goldschmid, M. L. (1971). Book review Piaget, J. The child’s conception of time. American Educational Research Journal, 8(1), 171–173.
- Freud, S. (1990). Projeto para uma psicologia científica. Em S. Freud, Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas completas de Sigmund Freud. Imago. (Original publicado em 1895.)
- Freud, S. (1990). Carta 52. Em S. Freud, Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas completas de Sigmund Freud. Imago. (Original publicado em 1896.)
- Freud, S. (1990). O inconsciente. Em S. Freud, Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas completas de Sigmund Freud. Imago. (Original publicado em 1915.)
- Fuchs, T. & Pallagrosi, M. (2018). Phenomenology of Temporality and Dimensional Psychopathology. Em M. Biondi, M. Pasquini & A. Picardi (Eds.), Dimensional Psychopathology (pp. 287–300). Springer. https://doi.org/10.1007/978-3-319-78202-7_10
- Fuchs, T. (2021). In Defence of the Human Being. Oxford University Press. Gifford, S. (1960). Sleep, Time, and the Early Ego; Comments on the Development of the 24-Hour Sleep-Wakefulness Pattern as a Precursor of Ego Functioning. Journal of the American Psychoanalytic Association, 8(1), 5–42. https://doi.org/10.1177/000306516000800101
- Green, A. (2002). Time in psychoanalysis. Some contradictory aspects. Free Association Books.
- Green, A. (2008). Freud’s concept of temporality: Differences with current ideas. The Internatinal Journal of Psychoanalysis, 89, 1029–1039. https://doi.org/10.1111/j.1745-8315.2008.00076.x
- Junior, C. A. & Arán, M. (2011). O lugar da experiência afetiva na gênese dos processos de subjetivação. Psicologia USP, 22(4), 725–745. https://doi.org/10.1590/S0103-65642011005000032
- Loewald, H. W. (1972). The experience of time. The Psychoanalytic Study of the Child, 27(1), 401–410. Doi: 10.1080/00797308.1972.11822722
- Lombardi, R. (2003). Knowledge and experience of time in primitive mental states. The International Journal of Psychoanalysis, 84: 1531–1549. https://doi.org/10.1516/002075703322642476
- O’Shaughnessy, E. (1981). A commemorative essay on W.R. Bion’s theory of thinking. Journal of Child Psychoanalysis, 7(2), 181–192. https://doi.org/10.1080/00754178108255031
- Sabbadini, A. (1989). How the Infant Develops a Sense of Time. British Journal of Psychotherapy, 5(4), 475–484.
- Schiffer, I. (1978). The Trauma of Time: A Psychoanalytic Investigation. International Universities Press.
- Stern, D. (1992). Bebé Mãe. Primeira relação humana. Edições Salamandra.
- Winnicott, D. (1994). O destino do objeto transicional. Em C. Winnicott, R. Shepherd & M. Davis (Eds.). Explorações Psicanalíticas. Artmed Editora. (Original publicado em 1959.)