Um sonho de ciência: Fantasia e realidade no cinema de ficção científica
Resumo
O presente trabalho explora as fronteiras ténues entre realidade circunstancial e fantasia onírica na tipologia cinematográfica de ficção científica. Partindo de uma breve análise da relação entre psicanálise e cinema, são identificados os elementos que aproximam a psicanálise (como “ciência dos sonhos”) da ficção científica (como “sonho de ciência”) e exploradas as convenções estruturais deste género cinematográfico. Frequentemente, a estrutura fílmica das obras de ficção científica abarca linhas narrativas paralelas que tanto sincrónica, como diacronicamente, combinam dramas individuais, prosaicos e familiares, e eventos grandiosos, fantásticos e alienígenas. Os últimos parecem facultar uma representação onírica das fantasias subjacentes aos primeiros, tornando o filme de ficção científica “paradoxalmente” mais realista do ponto de vista psíquico, ao englobar tanto o comportamento observável dos sujeitos em acção, como a forma como estes podem experienciar, ou representar, internamente/fantasmaticamente os dilemas da sua existência.
Palavras-chave
Cinema, Ficção Científica, Psicanálise, Fantasia
Biografia Autor
Henrique Testa Vicente
Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta. Professor Auxiliar do Instituto Superior Miguel Torga (ISMT). Investigador do Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade (CEPESE).
Carlos Farate
Psiquiatra e Psicanalista. Professor Associado do Instituto Superior Miguel Torga. Membro Titular, com funções didáticas, da Sociedade Portuguesa de Psicanálise (SPP) e da Associação Internacional de Psicanálise (IPA).
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