https://doi.org/10.51356/rpp.402a4
Filipe Matthes Saramago[1]; Maria João Abrantes[2]; Inês Lobo Madureira[3]; Ana Alexandre [4]; Marina Prieto Afonso Lencastre[5]
«Aquilo que herdaste de teus pais, conquista-o para fazê-lo teu.»
Fausto , Goethe
RESUMO
A transgeracionalidade psíquica do trauma remete-nos para o irrepresentável de uma história familiar impensada. Trauma vergonhoso ou secreto que insere o sujeito numa cadeia genealógica e o faz transportar um sofrimento que não é somente o seu. Revisitando o pensamento de diversos autores, este artigo procura entender o impacto da herança psíquica alienante e a forma como os fragmentos traumáticos inconscientes se transmitem através das gerações. Padrões de vinculação desregulados, sofrimentos inconscientes nos pais e avós e a dificuldade de mentalizar os conteúdos traumáticos que daí advêm perpetuam a existência de vazios de representação que se inscrevem inclusivamente na assinatura epigenética do indivíduo.
Palavras chave: Transgeracionalidade; Segredo; Telescopagem; Vinculação; Mentalização.
ABSTRACT
Transgenerationality of psychic trauma points to an unrepresentable and unthinked family history. A shameful or secret trauma that inserts the subject into a genealogical chain and makes him carry a suffering that is not only his. Revisiting several authors on this subject, the article seeks to understand the impact of alienating psychic inheritance and the ways unconscious traumatic fragments are transmitted throughout generations. Unregulated attachment patterns, unconscious suffering in parents and grandparents and the difficulty in mentalizing the traumatic contents, perpetuate the existence of voids of representation that are even inscribed in the individual's epigenetic signature.
Keywords: Transgenerationality; Secret; Telescoping; Attachment; Mentalization.
Como explicar as ansiedades, os terrores, os pesadelos incompreensíveis que habitam uma criança e o reaparecimento destes nas gerações seguintes? Como é que sobreviventes de situações traumáticas transmitem fragmentos do trauma não verbalizados aos seus filhos? Como pode alguém ser atingido pela história de um outro? Como se mantêm vivos os mortos?
Pensar a transmissão psíquica geracional implica olharmo-nos numa cadeia de memórias. Olhar o nosso papel, o nosso lugar, aquele que nos foi reservado numa corrente que vai além da história, do legado e da herança material. Um lugar inscrito numa estória familiar que, se incompreendida e irrepresentável, atravessa as gerações sem por elas passar, aplainando-as e criando espaços vazios na psique, onde fantasmas inconscientes ganham forma, agrilhoando-nos a uma repetição insalubre de um sofrimento que já não é o nosso.
A transgeracionalidade psíquica do trauma tem norteado diversos estudos, que seguiram abordagens e metodologias distintas. Após o Holocausto e, sobretudo, devido ao impacto psíquico que este veio a representar nas gerações descendentes das vítimas sobreviventes, houve particular interesse em aprofundar as consequências do trauma nas gerações seguintes, bem como os seus mecanismos de transmissão.
Pensarmos a transmissão geracional do trauma levou-nos à análise de diferentes formas de pensar a investigação sobre esta temática, revisitando diversos autores e conceitos. Desde Freud, para quem os mecanismos de identificação estariam na base de toda a transmissão, aos contributos da neurociência e da epigenética, passamos pelas conceptualizações de cripta e fantasma em Abraham & Törok (1976/1986, 1987/1995), pela telescopagem de gerações (Faimberg, 1993), pelo pacto denegativo em Kaës (1993/1997) e pelos objetos transgeracionais em Eiguer (1987, 1991). Finalmente, abordamos também a teoria da vinculação e o conceito de mentalização, enquanto momento específico e modalidade de transmissão psíquica.
A procura de compreender a transmissão do legado psíquico coloca-nos desde logo perante uma ideia de sujeito enquanto herdeiro. Herdeiro da história, da cultura e de experiências ancestrais, que o enriquecem e tornam mais vívido o colorido interno tingido pelos seus pensamentos e vivências singulares, mas que o podem aprisionar numa história que não é sua, forçando-o a viver aquém da sua própria originalidade.
Em The interpretation of dreams, Freud (1900/1997) traz-nos, a propósito da histeria, uma primeira ideia de transmissão inconsciente: a transmissão de traços inconscientes comuns, operada pelo movimento de identificação com o objeto ou com a fantasia do desejo do outro.
É em Totem and taboo (1913/1955) que Freud refere a continuidade psíquica que se dá ao longo das gerações, no momento da entrada do sujeito no mundo, que, ao recebê-lo num conjunto de desejos, ditos e representações, também o inscreve como um elo forçado de uma cadeia à qual este se submete. A partir do mito da lei original e das interdições primordiais, a transmissão do tabu e da culpa atua enquanto herança organizadora da sociedade e das disposições psíquicas do sujeito. A transmissão dos processos mentais mais importantes é inevitável, já que à geração imediata nada pode ser ocultado pela que a precede. Nada existe que possa ser realmente abolido sem que haja a irrupção do enigma, a presença enigmática do impensado nas gerações seguintes, que assim o poderão pensar.
Além dos conteúdos de transmissão constituídos pelos objetos simbólicos, tradições e aquisições culturais, Freud (1914/1957) fala ainda daqueles que o narcisismo organiza. O sujeito constitui-se numa dupla existência. É, por um lado, em si mesmo o seu próprio fim, procurando responder à exigência do seu narcisismo exclusivo; mas não deixa de ser o herdeiro de uma propriedade inalienável, dono temporário de um património que lhe sobrevive, constituindo-se como sujeito de um grupo.
Escravo, beneficiário e herdeiro de uma cadeia intersubjetiva, o sujeito constitui-se numa transmissão pela via narcísica, com base num modelo parental determinado pelo revivescer e reprodução do narcisismo dos pais, então renascido. O nascimento psíquico é assim marcado pelos investimentos depositados na criança pelos pais, pela transmissão dos seus sonhos vividos ou renunciados, dos desejos realizados ou insatisfeitos, levando à formação de um ideal do eu na criança por projeção do eu ideal dos pais. O sujeito emerge e é, então, submerso na palavra e no desejo das gerações que o precederam (Freud, 1914/1957).
Influído e determinado de forma inconsciente pela sombra do objeto, o sujeito constrói-se e enriquece-se no processo de identificação a este, pela introjeção das suas características e qualidades. A identificação, forma original de laço afetivo com o objeto, é assim, também para Freud, a via régia da transmissão. Tudo o que se transmite dentro do grupo acontece por via do processo de identificação (Freud, 1921/1955).
A transmissão é um processo ativo, de reinscrição e transformação únicas e singulares, da qual o sujeito, mas também o grupo, são parte integrante pelo trabalho de ligação e de elaboração psíquicas. Os conteúdos herdados da geração precedente não são apenas tomados, mas também transformados a partir da própria existência. Daqui, decorre a possibilidade de cada geração se situar perante as outras e de cada sujeito se alojar, com história e lugar próprio, no seio de um grupo (Piva, 2009) e de uma história familiar.
Em sentido contrário, se não há elaboração do que foi apropriado pelo sujeito, a conservação conduz à repetição e a herança torna-se devir (Piva, 2006). Se falham as ligações e as transformações, pode então a transmissão psíquica tornar-se alienante e não estruturante, atravessando as gerações e impondo-se aos descendentes em estado bruto (Granjon, 1994/2000). Assim, ao invés de uma transmissão intergeracional, estruturante e edificada num espaço de metabolização do material psíquico herdado da geração mais próxima, que, transformado, passará à geração seguinte (Correa, 2000), teríamos então uma transmissão transgeracional, em que a herança psíquica se mantém inconsciente, avessa à simbolização e à elaboração, abrindo lacunas e vazios na transmissão direta de elementos irrepresentáveis, encriptados, partes não acessíveis da história de um outro, que atravessam diversas gerações e se perpetuam, conservados em repetições de acontecimentos vividos (Granjon, 1994/2000).
O acontecimento com potencialidade traumática, se não impede, pelo menos perturba o processo de elaboração e integração no psiquismo do sujeito, dando origem a criptas, vãos e inclusões. Estes despojos encobertos, alheios ao labor psíquico, são conservados em «estado bruto, consagrados à repetição e oferecidos às identificações da criança com a secreta esperança de que esta, herdeira e suplente narcísico, possa realizar este trabalho fracassado» (Granjon, 1994/2000, p. 26).
Em Freud, a temática do trauma aparece inicialmente ligada ao seu trabalho clínico com pacientes neuróticos e sobretudo na procura de compreensão para a histeria. Retomando a ideia da origem traumática de J. M. Charcot, Freud vê o trauma como resultado de vivências da realidade externa, de causas sexuais, sendo a histeria fruto de uma sedução real, de um abuso sexual sofrido pelo sujeito durante a infância (Roudinesco & Plon, 1997).
Mas não é aí, nesse momento, que o trauma se instala. Ele dá-se na conjugação de dois momentos apartados pelo tempo. Um primeiro evento, de carácter sexual, inscrito na realidade, é vivido de forma submissa e passiva pela criança, sem que por esta seja compreendido ou assuma um significado sexual. E um momento posterior (normalmente na puberdade), em que uma vivência, mesmo que anódina, é associada à primeira e sentida como análoga na sua significação da emoção de natureza sexual.
O evento primeiro, então evocado, é ressignificado, sendo-lhe outorgado um carácter sexual e dando lugar ao aparecimento do trauma. Este não reside, contudo, na vida adulta, mas, antes, no reviver póstumo da intensidade evocada pela primeira cena. Não são os eventos que constituem o trauma, mas, sim, a sua recordação, quando o sujeito atinge a maturidade sexual e compreende o sentido dos dois momentos (Uchitel, 2001).
Já em 1896, numa carta a Fliess, Freud esboçara a ideia de que eventos muito iniciais da vida podem ser posteriormente revisitados e reorganizados no aparelho psíquico através de novas experiências, alcançando um poder traumático que as experiências iniciais não tinham de forma clara para a criança. O conceito original de «Nachträglichkeit» [6] exprime a ideia, que será retrabalhada ao longo da sua obra, de que as experiências primárias traumáticas, sem nome ou representação, poderão ser significadas através de representantes ideativos e afetivos que foram sendo armazenados e conferem retroativamente (nachträglich) significado ao evento não compreendido e reativado. Mais tarde, Freud teorizou que a apreensão pela transferência dos eventos iniciais faz-se a partir das fantasias edipianas, que representam o todo da sexualidade infantil. Os impulsos instintivos podem ser significativamente interpretados na transferência ( nachträglich) e adquirirem uma estrutura narrativa suscetível de preencher lacunas da representação individual.
A conceptualização de Freud em torno do trauma vai-se transformando, e a constatação da importância da fantasia incestuosa na histeria leva-o a abandonar a teoria da sedução em favor da teoria do fantasma. Os eventos de excitação sexual sentida na infância não são agora vistos como tendo forçosamente acontecido na realidade objetiva, mas são antes interpretados como produtos da realidade interna, da fantasia incestuosa inconsciente. Esta arroga agora a força que outrora pertencia ao evento traumático (Masson, 1984).
A ideia do trauma nascido a dois tempos mantém-se; o que muda é a natureza do material. O trauma não é a sedução sexual explícita, mas, antes, a experiência do que é ouvido ou visto e que inicialmente está desligado, desprovido de sentido. Esse só chega depois e adjudica a construção de fachadas psíquicas, fantasias, que impedem o acesso à recordação, e que «são fabricadas por meio de coisas ouvidas e usadas posteriormente, assim combinando coisas experimentadas e ouvidas, acontecimentos passados (da história dos pais e antepassados) e coisas que foram vistas pela própria pessoa» (Freud apud Masson, 1986, p. 241). Para Freud, a criança completa «as lacunas da sua verdade individual com a verdade pré-histórica, põe a experiência dos ancestrais no lugar da própria experiência» (Freud, 1918/1955, p. 97). Traumas muito iniciais sem nome, cenas silenciosas cujo montante de afeto se inscreve no sistema mnésico, acarretam experiências filogenéticas obscuras que podem ser interpretadas posteriormente através de dois movimentos «nachträglich»: através da experiência dos antepassados, vivida como fantasias, e através da experiência da transferência, que dá origem a interpretações secundárias. O conceito freudiano de «Nachträglichkeit» confere um significado traumático não ao evento, mas à memória, avançando com uma compreensão psicanalítica da temporalidade e permitindo uma relação possível entre a teoria da libido e a teoria do objeto (Dahl, 2011).
Em Ferenczi, o trauma encerra um carácter de inevitabilidade, constituindo-se, na sua conceção inicial do conceito, como algo estruturante e necessário à fundação subjetiva do sujeito. A relação originária, organizadora do psiquismo, com o primeiro objeto de amor, assume-se como sedutora e traumática, porque a omnipotência incondicional do bebé é posta em causa pela sua submissão às leis impostas pelo adulto (nomeadamente no que concerne às questões da higiene). O bebé conhece assim, em si mesmo, mais do que os sentimentos de prazer, também os seus opostos, o que leva a mudanças no seu aparelho psíquico (Ferenczi, 1913/1992a).
O carácter estruturante do trauma é visto por Ferenczi (1924/1993) a partir da relação que estabelece entre as experiências de sedução na infância e as fantasias sexuais precoces. O autor adianta que, até certo ponto ótimo, o trauma de sedução sexual infantil e as experiências associadas protegem o processo de desenvolvimento de eventuais transvios. Mais, «certa quantidade de experiências sexuais […] longe de prejudicar mais tarde a normalidade […] antes a favoreceriam» (Ferenczi, 1924/1993, p. 248), contribuindo para a extensão e vividez da fantasia.
No desenvolvimento da sua conceptualização, Ferenczi resgata a importância da realidade externa na constituição do trauma, ideia inicialmente defendida por Freud, que depois a abandonou a favor da teoria do fantasma. O trauma assume uma tonalidade negativa e são os fatores exógenos — e não o primado da fantasia — que o suportam, neste caso a falha na relação entre o sujeito e o outro, o que perturba a formação do aparelho psíquico.
O trauma passa a ser entendido como tendo origem em dois tempos. Não como em Freud, onde o trauma surge na ressignificação do evento traumático inicial, mas, antes, no desmentido — por parte do adulto (até então sentido como protetor e modelo ideal de identificação) — da experiência real e violenta vivenciada pela criança. «O pior é realmente a negação, a afirmação de que não aconteceu nada […] é isso, sobretudo, o que torna o traumatismo patogénico» (Ferenczi, 1931/1992b, p. 79–80).
O relato da criança é ouvido pelo adulto como uma fantasia infantil. O acontecimento real é desautorizado e a palavra da criança não é legitimada, porque é ela própria traumática para o adulto, sendo relegada à condição de logro ou devaneio. Ferenczi fala de uma confusão de línguas entre a criança e o adulto sentido como abusador. A primeira, na sua demanda de ternura, anterior ao primado genital, é correspondida pelo segundo com a linguagem da paixão no sentido genital, que não está ainda ao alcance da criança (na integração da genitalidade) (Ferenczi, 1933/1992c).
O trauma é, pois, para Ferenczi um resultado do desmentido, da confusão de línguas, capaz de paralisar o pensamento e desqualificar o afeto, levando a uma clivagem no psiquismo da criança, onde o sentido do acontecimento traumático é congelado, alojando-se como um corpo estranho (fora do campo representacional, mas que conserva toda sua intensidade). Torna-se apenas acessível pela culpa e pela auto-agressão recriminatória, produtos da identificação com o agressor. Por «identificação, digamos, por introjeção do agressor, este desaparece enquanto realidade exterior e torna-se intrapsíquico» (Ferenczi, 1933/1992c, p. 102).
Para Abraham e Törok (1987/1995), a identificação com o agressor denuncia ela própria a ausência da introjeção, um fracasso nesta possibilidade que se configura assim como incorporação, fantasia primitiva que se aproxima de uma satisfação alucinatória do desejo (ao contrário da introjeção, que se constitui como um processo laborioso, orientado no sentido da realidade). A incorporação denuncia então uma falha da introjeção e o impedimento à elaboração permanente.
Nunca se aportando de forma explícita ao conceito de trauma, os autores concebem-no como um bloqueio do trabalho introjetivo, que paralisa o processo de identificação e constitui uma impossibilidade de elaboração intersubjetiva do evento traumático. Não será tanto a existência e a intensidade deste acontecimento que instaura o trauma, mas, antes, a impossibilidade da elaboração psíquica dessa experiência que inunda o psiquismo, a não construção de representações que a contenham, a introjeção impossível. O maturado e progressivo processo de introjeção é substituído pela incorporação instantânea de perdas narcísicas irrepresentáveis, de lutos indizíveis não elaborados, aos quais não foi consentida significação, e que instalam no indivíduo uma sepultura secreta (Abraham & Törok, 1987/1995).
A cripta surge assim na conceptualização dos autores como uma configuração psíquica que representa o enquistamento de uma experiência vivida como traumática, um túmulo que esconde um segredo familiar inconfessável e vergonhoso — de um objeto que encontra no sujeito o lugar de ideal do eu —, condenado a manter-se velado, ininteligível e enterrado vivo numa zona clivada do ego. O espaço morto do ego que alberga a cripta não se encontra vazio ou desocupado para o objeto incorporado; mantém-se ego, clivado e inconsciente dessa clivagem e do processo de incorporação, pelo que a cripta se mantém, ela própria, inconsciente. Neste ponto, Abraham e Törok (1976/1986) adiantam que o ego desconhece a existência da cripta, na mesma medida em que o ego fragmentado da cripta ignora o que está para lá das suas paredes. A cripta atua no ego como um modo especial de inconsciente, já que cada fragmento é consciente de si próprio e inconsciente do terreno fora da cripta.
Na cripta, dentro dos muros intrapsíquicos construídos para proteger o segredo, as palavras que a habitam mantêm-se caladas, sem que possam ser expressas para o significar, verificando-se uma efetiva destruição da capacidade figurativa das palavras. Acontece, contudo, que estas palavras enterradas e preservadas vivas, as cenas congeladas, os afetos incorporados, não deixam de visitar por vezes «o guardião do cemitério» (Abraham & Törok, 1987/1995, p. 249), sob a forma de um «fantasma da cripta» (ibidem) que o vem assombrar.
A crença popular traz-nos a ideia de que o espírito dos mortos pode regressar da tumba para habitar nos vivos ou junto deles. Mas este espírito não é mais do que o fantasma encriptado dos vivos, um produto que procura materializar a lacuna deixada aberta, vaga de sentido, pela ocultação de uma parte da vida de um objeto inconsciente
A teoria do fantasma é elaborada por Abraham e Törok (1987/1995) a partir da reflexão acerca das ressonâncias da cripta nas gerações seguintes, e do aparecimento da assombração (pelo fantasma) em situações onde o nascimento da criança se dá no seio de uma família já portadora de um segredo vergonhoso, sobressaindo assim a ligação direta ao fenómeno da transmissão transgeracional. «Um dizer enterrado em um dos pais torna-se para a criança um morto sem sepultura. Esse fantasma retorna então, a partir do inconsciente e vem assombrar, induzindo fobias, loucuras, obsessões. O seu efeito pode chegar a atravessar gerações e determinar o destino de uma raça.» (Abraham & Törok, 1987/1995, p. 278)
Perante uma inclusão críptica no psiquismo materno, a criança enfrenta as palavras que preenchem o silêncio seletivo sobre tudo o que se acerca do segredo encriptado. Às palavras da mãe, é então arrancado o valor de comunicação interna, conduzindo a falhas graves na relação com o objeto interno, e na linguagem da criança enquanto instrumento de separação. As ocultas palavras do segredo parental, que sustentam o fantasma, atuam como ausências e ruturas inassimiláveis da coerência dos encadeamentos associativos, levando muitas vezes a uma compulsão de repetição que, ao serviço do ego, o protegem da invasão pelo retorno do fantasma (Abraham & Törok, 1987/1995).
As imagens forjadas pela criança, frente ao que é indizível para os pais e que para ela é agora inominável, encontram o seu material em eventos ou imagens de objetos, percebidos como indutores de intensa e repetida angústia nas figuras parentais; bem como em palavras e seus fragmentos, sentidos no discurso dos pais como tomados por uma forte carga emocional, desligada da compreensão. O atravessar das gerações por um tal produto transformará o que era já inominável, para o descendente da cripta, em impensável, para o descendente do assombrado pelo fantasma (Abraham & Törok, 1987/1995).
Formação do inconsciente que nunca foi consciente, o fantasma é produto da transmissão de um saber não sabido, de conteúdos do inconsciente dos pais ao inconsciente do filho e que, revelados neste, dão conta da ferida ou catástrofe narcísica daqueles (Abraham & Törok, 1987/1995), e/ou dos seus antepassados.
A invasão alienante do sujeito pelos elementos do fantasma e por um guião de segredo e vergonha não sabido, que sob o peso do mandato ancestral é encenado pelo descendente, levam-no à necessidade de procurar, fora de si próprio, um depósito para a sua não-história. As partes alienadas de si mesmo são então expelidas e colocadas num descendente narcisicamente eleito. Esta identificação inconsciente (projetiva) alienante serve de carta de alforria ao sujeito, para escravizar o representante designado da geração seguinte. Ao viver uma história avessa à representação e que em parte pertence a um outro, o herdeiro mantém uma parte clivada do seu psiquismo, alienada e estranha a si mesmo, sendo um dos atores da telescopagem de gerações (Faimberg, 1993).
Para Faimberg (1987, 1988), a transmissão (alienante) dá-se assim mesmo, numa lógica de regulação narcísica do objeto, alimentando-se da apropriação das qualidades dos descendentes pela geração que a precede. O amor narcísico dos pais tende a espoliar a criança daquilo que lhe dá prazer, da sua identidade positiva, operando uma função de apropriação. Em sentido contrário, quando a criança consegue distanciar-se do desejo e da expectativa dos seus pais, gera nestes um ódio para consigo, que mais não é do que uma projeção do que odeiam em si mesmos, levando a uma anulação da separação que a criança enceta. Através de uma função de intrusão, o que é recusado pelos pais é expulso ativamente na criança, sendo a sua identidade determinada pelo que é rejeitado pelos pais na sua própria história. A criança é, pois, odiada porque a sua história é solidária com a dos ascendentes, permanecendo refém de um tempo circular, onde as gerações se encontram condensadas, sobrepostas umas às outras, sem a existência de um espaço psíquico que permita o desenvolvimento e a diferenciação de uma identidade própria, ficando a criança acorrentada ao narcisismo dos pais (Faimberg, 2005).
O irrepresentável secreto e silencioso preenche as histórias vazias da genealogia, fundando uma cadeia traumática transgeracional (Gomel, 1997). Os novos, na impossibilidade de transformarem e tornarem sua, portanto, diferenciada, a herança negativa que lhes foi depositada por mais do que um outro, e ao serem convocados para a constelação traumática dos antigos, cumprem estes diferentes papéis, servindo-lhes inclusivamente de continente para as suas angústias, numa inversão da linha geracional.
Frente a uma urgência em transmitir, que consubstancia o movimento atávico e progrediente das gerações, a criança, investida narcisicamente e instalada como um elo imposto na corrente geracional, tem a possibilidade de edificar a sua própria subjetividade e adquirir este lugar que a funda. Ao constituir-se psiquicamente, assume o papel de dar continuidade ao conjunto da família que a acolhe, herdando dos pais o produto, mas também a subtração nos laços de aliança dos mesmos — fiel depositária do que foi silenciado antes, e garante de que assim permanecerá consigo (Kaës, 1993/1997).
É neste contexto que se estabelece o pacto denegativo (Kaës, 1993/1997), cujo desígnio é conservar o grupo familiar, contendo e mantendo longe do alcance da consciência determinados assuntos negativos, de transmissão psíquica, no momento da aliança. Este pacto inconsciente diz respeito às diversas operações psíquicas em laboração para que o vínculo intersubjetivo se constitua ou se mantenha, com o sentido da organização do laço e da sua complementaridade de interesses, assegurando deste modo a continuidade dos investimentos e dos benefícios ligados à subsistência dos ideais, do pacto e do contrato narcísico (Kaës, 2000).
Aulagnier (1975) fala-nos deste contrato narcísico firmado com a criança, cujos termos haviam já sido estabelecidos por Freud em 1914. Talhado no pré-investimento dos pais em relação ao infante, o clausulado do contrato determina que pelo segundo outorgante (a criança) seja dada continuidade aos valores e leis previamente estabelecidos, ao mesmo tempo que espera o reconhecimento e o sentimento de pertença no seio familiar e, posteriormente, no grupo social. A missão de que cada criança é investida desde as primeiras horas de vida passa pela transmissão transgeracional dos fantasmas dos pais. Esta adota a forma de um fantasma no berçário que vigia o recém-nascido e se deita ao seu lado, corporalizado por expectativas, conscientes e inconscientes, que as gerações pregressas fazem pesar sobre o bebé e toda a sua vida (Fraiberg et al., 1975).
O contrato narcísico, além de vincular a criança a uma origem e de lhe conceder o direito de ocupar um lugar na corrente familiar, assegura também um sentido de continuidade do investimento libidinal de autoconservação do conjunto que integra.
Além da polaridade organizadora do laço acima referida, Kaës chama a atenção para o polo defensivo do pacto denegativo, já que cada conjunto se organiza também negativamente em torno de «uma comunidade de renúncias e sacrifícios […] rejeições e recalcamentos […] criando no conjunto do não significável, do não transformável, zonas de silêncio, bolsões de intoxicação, espaços-lixeiras ou linhas de fuga que mantêm o sujeito estrangeiro à sua própria história» (Kaës, 2000, p. 46).
A relação com a criança, mesmo quando ainda feto, é impregnada de conteúdos comunicacionais com diversos graus de compreensibilidade, alguns dos quais enigmáticos para si e despidos de sentido até para os seus pais. Estas mensagens indecifráveis, impostas e depositadas na criança, são conservadas enquanto significantes enigmáticos (Laplanche, J. apud Granjon, 1994/2000) — para os quais a criança não tem a cifra —, oriundos de um mundo psíquico parental embebido por significações inconscientes, cujo código os próprios pais ignoram (Trachtenberg, 2005). Confundem-se os pensamentos, esfumam-se as fronteiras e funda-se uma relação narcísica alienante, onde o ego não se distingue do não ego (Chem, 2005).
Parte de desconhecido e de incompreensível viaja com as mensagens personalizadas e providas de sentido, que a criança capta nos cuidados maternos, nos elementos da relação educativa, na palavra, na voz e na voz sem palavra. É a mãe a principal encenadora desta transmissão, embora os conteúdos da peça tenham sido escritos pela pena do legado familiar. E é a criança a atriz principal de um papel que para ela não pode ter sentido, restando-lhe mantê-lo em inclusões ou procurar incessantemente um significado para o que não lhe pertence. Porém, quando se confronta com uma poderosa herança negativa que invade o seu psiquismo ainda não fundado, a criança pode identificar-se ao negativo e ao que não pode ainda ser elaborado. Fiel ao pacto estabelecido, a criança liberta os pais e constitui-se ela própria como um continente de negativo, o negativo em si próprio, «o impensável, o irrepresentável, alienada no transgeracional e forçada a ser» (Granjon, 1994/2000, p. 30), ocupando o lugar e não o conteúdo do que deverá permanecer secreto, manter-se calado, impensado. Nestes casos mais graves, fundadores da psicose e autismo na criança, esta torna-se o negativo do contrato narcísico, estabelecendo assim um contrato psicótico (Granjon, 1994/2000), onde abandona a sua função de herdeira com a obrigação de transmitir.
Para Eiguer (1997), a patologia transgeracional pode ser transmitida pela identificação atributiva que atua nos processos alienantes transgeracionais. Ela assenta nos avatares do luto e do sofrimento dos ancestrais, que o sujeito vive como seu. Ao filho, é atribuída uma representação de objeto interno, que o pai ou a mãe não podem vivenciar ou elaborar em si mesmo, influindo e fragilizando a capacidade representacional da criança para elaborar o sofrimento psíquico.
O sistema representacional e os afetos herdados não estão imunes à modificação pela força do trauma transgeracional, que o autor antevê na emergência do não-dito (onde opera o segredo e a clivagem em criptas que guardam fantasmas), do mal-dito (a palavra extraviada que não encontra o seu estatuto enquanto tal e que atua nos bastidores da psique, evocada na maldição praguejada pelo ancestral) e do excessivamente-dito (onde a presença excessiva do antepassado coarta o papel organizador do recalcamento, comprometendo a ação do sujeito) (Eiguer, 1997).
Na compreensão das particularidades da transmissão transgeracional e da patologia associada, Eiguer (1987, 1991) refere-se à presença de um objeto transgeracional, oculto da consciência, mas cristalizado na psique do sujeito. Inscrito como representação e sustentado pelo investimento psíquico do sujeito, este objeto, ancestral direto ou colateral, cuja alusão é proibida pela política de segredo vigente, desencadeia identificações e suscita fantasmas capazes de desbravar caminhos para partes do aparelho psíquico mantidas à margem por meio de uma clivagem severa.
O objeto transgeracional, objeto do outro e não do próprio, mas que se investe sem nunca se ter conhecido, está gravado no aparelho psíquico por representações de palavras e de coisas avessas à moral, de traumas dolorosos, ganhando por vezes, o objeto, a condição de um vazio de representação ou de uma protorrepresentação de coisa incapaz de aceder ao estatuto de palavra e pensamento (Eiguer, 1991).
Eiguer (1991) fala-nos de três tipos de objetos transgeracionais que criam lacunas e vazios na história familiar. Objetos benevolentes, indulgentes, representações de objetos de carinho que reivindicam a fidelidade edipiana, sendo o acesso (ou não) ao édipo subordinado ao objeto interno dos pais, e à natureza do material inconsciente que lhes foi transmitido pelos seus ascendentes. Objetos idealizados, grandiosos, ampliados, que exigem compensações, impõem sentimentos de dívida e inspiram sentimentos de culpa. O antepassado perdido, sobre o qual o luto permanece por fazer, paralisa e parasita o psiquismo do sujeito, corrompendo os sentimentos de identidade individual e familiar e levando-o a uma identificação narcísica ao objeto. E objetos-fantasmas, transladados em vazios irrepresentáveis presentes no psiquismo dos descendentes, envolvendo algo reprovável e pecaminoso cometido pelos ancestrais, que se tornara num segredo vergonhoso. Esta categoria de objeto permanece como um corpo estranho no psiquismo do outro. O sujeito que sofre a intrusão e a violência deste tipo de transmissão será nomeado, chamado a representar e situado num determinado lugar, de acordo com o desejo dos porta-vozes do legado transgeracional daquele grupo. O investimento no fantasma, sobre o qual escoa a líbido do bebé, leva ao minguado investimento no objeto primário e ao vazio relacional que daí advém.
O trabalho da transmissão transgeracional do trauma é da ordem do segredo vergonhoso não falado, do elemento inominável, do luto não elaborado; e os fantasmas sugerem sempre o local onde os lutos não foram feitos (Harris, 2006 apud Salberg, 2015).
Contudo, o modo como esta transmissão se dá, mantém-se de alguma forma num plano misterioso. Como se transmitem estes fantasmas? Como explicar as ansiedades, os terrores, os pesadelos que habitam uma criança e o reaparecimento destes nas gerações seguintes? Como é que sobreviventes de situações traumáticas transmitem fragmentos do trauma não verbalizados aos seus filhos? Como pode alguém ser atingido pela história de um outro? Como se mantêm vivos os mortos?
Para Freud (1921/1955), seriam os mecanismos de identificação e transferência que estariam na base de toda a transmissão. Granjon diz-nos que «transmitir é mais importante do que aquilo que é transmitido, e o que será encontrado na descendência é o indizível, o impensável, o processo do segredo, mais do que o seu conteúdo» (1994/2000, p. 26). A família é não apenas o lugar, mas também o aparelho da transmissão psíquica. Aparelho psíquico familiar que se constitui como um espaço psíquico onde atuam alianças organizadoras de laços e onde, a partir das lacunas e malogros da genealogia do casal parental, se cria um envelope genealógico familiar (Granjon, 1994/2000).
Ogden (2009) pega nas ideias de Bion e refere que são precisas duas mentes para pensar os pensamentos mais perturbadores de alguém. Salberg (2015), na senda da telescopagem de gerações de Faimberg, avança que são precisas três gerações para conter sentimentos e eventos desestruturantes.
J. Bowlby (apud Salberg, 2015) mostrou interesse pelo impacto psíquico dos estados emocionais da mãe na criança, levando-o a explorar a transmissão intergeracional das dificuldades durante o processo de vinculação, e a forma como os assuntos não resolvidos numa geração podem ser visitados na seguinte.
O processo de transmissão de conteúdos inconscientes tóxicos, que, por vezes, aparece na literatura envolto numa bruma mística, pode, de facto, de acordo com Salberg (2015), ser clarificado se olhado através da lente da teoria da vinculação. A vinculação, pois, como modo de transmissão dinâmico, que acontece implícita e explicitamente na maioria, senão em todas, as circunstâncias de transmissão transgeracional (Salberg, 2019).
A saudável unidade de vinculação realizada por pais e filhos permite uma profunda comunicação inconsciente de afetos e pensamentos pré-verbais, transmitidos através do registo da sintonização e des-sintonização, bem como pelos processos ativos da regulação e/ou dissociação mútua dos comportamentos, das emoções e das palavras, ditas ou não ditas, contidas na relação self-outro. A observação e atenção permanentes da criança à ação, à fala e ao afeto dos pais levam-na à absorção da mente consciente e inconsciente destes, e, num registo móvel de sintonizações e des-sintonizações, ao ajuste e adaptação à presença ou à ausência emocional dos seus pais. A vinculação é uma busca precoce de ligação, aquém do tempo organizado do discurso, no mundo não-verbal, pré-verbal e infraverbal dos olhares, dos sons, dos toques, mas também da sua ausência. E assim, no palco relacional do constante intercâmbio de estados de humor, de emoções e suas intensidades, que ocorrem entre a mãe e o bebé, contam-se histórias, mesmo quando ainda não inteiramente simbolizadas, onde o silêncio e a vocalização se transcrevem num subtexto implícito (Salberg, 2015).
No que diz respeito à transmissão do trauma, Salberg (2015) acredita que, na ausência de uma mãe presente, integral e emocionalmente vital, a criança se vincula ao que está presente, mas também ao que está ausente, ao que está vivo e ao que está morto. A mãe morta (Green, 1983/1999), viva, mas ausente, antes animada, mas agora arrancada à criança e levada para longe pela depressão, indu-la num estado branco, vazio, a psicose branca, que resulta num desligamento desta mãe morta e ao mesmo tempo numa identificação a ela, instalando-se no inconsciente da criança um sentido de morte e uma perda de sentido. Sintonizada com a ausência materna, a criança entra assim algures no trauma dentro da sua mãe (Salberg, 2019).
A ausência na criança, o legado do trauma sem um outro empático que com ela testemunhe estas experiências, deixa cravada a marca de um terceiro morto, que imprime na criança um sentido de «not-there-ness» (Gerson, 2009, p. 1347), substância da ausência bem como daquilo que a preenche.
Grand (2000) fala-nos de buracos na ligação à mãe e do desejo da criança de se ligar ao espaço ausente na mãe traumatizada, desejo este que a deixa cativa do trauma e sofrimento desta, na eterna procura de uma mãe que está fora de alcance. As ausências e as fantasias inconscientes são assim passadas para a geração seguinte, através de uma transmissão incorporada, envolvida pela relação de vinculação.
Pais tolhidos pelo trauma e pela desregulação emocional podem tornar-se assustadores para os seus filhos, transmitindo a sua desorganização interna através da imprevisibilidade, da raiva e de uma atitude punitiva dirigida à criança, mas também pela exposição desta a uma realidade cacofónica de eventos diários, que são testemunhados e experienciados pela criança (Lieberman, 2014).
Para esta criança, a figura securizante é muitas vezes a figura a temer, e na sua relação de vinculação primária, tem de lidar com a fragmentação decorrente do trauma parental que, não metabolizado, afeta inevitavelmente a vinculação, dando origem ao que tem vindo a ser chamado de trauma relacional (Fonagy, 2001; Salberg, 2015).
De acordo com Salberg (2019), a violência do trauma fratura a experiência individual de se estar no mundo, esgarçando o tecido constituinte da vinculação na sua forma própria de nos sentirmos seguros. A experiência traumática da mãe torna-a inacessível nesse lugar, deixando uma marca nos processos de vinculação da criança, que sente essa rutura no interior de si. O sentimento que advém do sentir-se ligada a esta mãe constitui-se como textura da vinculação traumática (Salberg, 2015), na qual a criança se molda à medida da dor materna.
Salberg (2015) sugere que em circunstâncias de grande desregulação e intensidade afetiva, geradas a partir de um trauma não metabolizado, a criança, para manter a relação de vinculação, terá de mergulhar no trauma, enredar-se nele, sintonizar-se com as mensagens da história traumática, vinculando-se assim à presença e à ausência da mãe. Esta dança de sintonização e adaptação é, para a autora, uma tentativa contínua da criança de reparar a mãe a partir do exterior, reparação que nunca pode ser total já que o dano reside no interior. A criança precisa de sentir que tem acesso à mente da mãe e que lá encontra um lugar onde pode existir, mas se parte dela está morta, escondida e/ou dissociada, a busca pela mãe torna-se numa terrível procura por um laço em falta, numa vinculação a uma ausência.
Ao trauma, faltam, por vezes, pedaços de narrativa ou pedaços de afeto ou pedaços de ambos, mas quando ele visita transgeracionalmente a criança através de padrões de vinculação disruptivos, podemos encontrar o modo como esta transmissão se deu, se procurarmos a sintonia emocional e a natureza do vínculo que a criança estabeleceu com os seus pais (Salberg, 2015).
Tal como Salberg, também Fonagy e Target (2006) relevam o papel da vinculação, relacionando-a com a mentalização — entendida esta como a capacidade de compreensão de si próprio e dos outros enquanto seres psicológicos, dos seus estados mentais, pensamentos, sentimentos, intenções, desejos e motivações subjacentes aos comportamentos (Fonagy et al., 1994).
Esta relação (entre vinculação e mentalização) é compreendida no contexto do funcionamento reflexivo, implícito à capacidade de mentalizar, que se desenvolve essencialmente na relação entre pais e filhos, quando aqueles respondem de forma adequada aos estados emocionais destes. São estas experiências relacionais que permitem à criança ter um espaço interno no qual pode compreender e distinguir estados mentais e emoções próprias e alheias, bem como desenvolver uma perceção de si como uma identidade coerente. O funcionamento reflexivo dos pais opera então como impulsionador do desenvolvimento da capacidade de mentalização da criança, intervindo no desenvolvimento da compreensão das emoções durante a infância e adolescência (Fonagy & Target, 2006).
O papel central que a mentalização desempenha na transmissão transgeracional do trauma tem vindo a ser apontado por Fonagy e colaboradores (1994) e Ensink e colaboradores (2015), que aludem à grande dificuldade que adultos com vivências de situações de maus tratos na infância podem manifestar no plano da mentalização das suas experiências traumáticas. Quando a força do acontecimento traumático transcende a intensidade das experiências com que habitualmente o sujeito depara ao longo da sua vida, dificilmente se irá valer do que foi apreendido como experiências habituais para julgar e compreender o trauma.
A dificuldade, ou mesmo a impossibilidade de uma criança mentalizar uma experiência traumática, decorre do facto de as crianças terem dificuldade de elaborar por si mesmas uma história coerente de um trauma, a menos que sejam sustentadas por um adulto de referência em quem possam confiar. Sem esta narrativa, que permite à criança tornar explícitas as memórias por meio de uma representação verbal da experiência, as memórias traumáticas tendem a permanecer implícitas e muito próximas da experiência bruta (Brewin, 2011).
A criança, no intuito de manter a relação de vinculação, pode sentir-se aterrorizada pela experiência de maus tratos vividos pelos pais e pelo mundo interno destes, povoado de representações deformadas deles mesmos (Allen, 2013; Fonagy & Target, 2006). No entanto, da mesma forma que o trauma pode comprometer o desenvolvimento da capacidade de mentalização, a sua conservação reflexiva em contextos traumáticos pode significar um importante fator de resiliência e ser determinante na forma como o trauma se irá transmitir na geração seguinte. A este propósito, num estudo realizado por Fonagy e os seus colaboradores (1994), observou-se que mães confrontadas com diferentes fatores de risco e carências, mas nas quais ainda assim se verifica um nível elevado de funcionamento reflexivo, têm maior probabilidade de desenvolver uma vinculação segura com os seus filhos e de não repetir com estes os maus tratos que sofreram dos seus pais. Esta observação parece pôr em evidência o papel da mentalização como um mediador potencial da transmissão transgeracional do trauma.
Em sentido contrário, a existência de traumas não refletidos pelos pais terá um impacto sobre a parentalidade, dando origem aos fantasmas no berçário (Fraiberg et al., 1975), enquanto vozes ou presenças assustadoras no mundo interno da criança. Fonagy (1993) concebe estes fantasmas como produtos de uma ausência de mentalização das experiências emocionais dolorosas de medo, impotência, vergonha ou culpa, que situam o pai ou a mãe no risco de se identificarem com o agressor, mais do que responderem de modo adequado ao desamparo da criança. Se inicialmente essa ausência de elaboração foi pensada como uma incapacidade de mentalização nas relações de vinculação em geral, os trabalhos mais recentes sugerem que, no adulto, a ausência de mentalização toca mais especificamente nas experiências traumáticas. Com efeito, as mães do estudo acima referido (Fonagy et al., 1994) não apresentam incapacidade de mentalização ligada às suas figuras de vinculação, mas, antes, uma diminuição marcada do seu funcionamento reflexivo quando são abordadas especificamente as suas experiências traumáticas.
As atuais pesquisas na genética e nas neurociências têm-nos trazido importantes contributos para a compreensão da transgeracionalidade e para a forma como fatores ambientais, entalhados numa linha histórica de tempo, podem afetar a expressão genética no cérebro, com os respetivos aspetos hereditários associados.
Apesar de o tema da herança epigenética transgeracional ser atualmente ainda uma fonte profusa de perguntas, mais do que de respostas, estudos recentes estão a desafiar o saber estabelecido sobre a hereditariedade e apontam para as consequências da transmissão dos efeitos ambientais, através de mecanismos epigenéticos, nas gerações futuras (para um estudo mais aprofundado do tema, consultar Meloni, 2014).
Não existem fatores genéticos que possam ser estudados à parte do ambiente, tal como não existem fatores ambientais que funcionem arredados do genoma, o que prende as operações deste ao contexto em que ocorrem (Meaney, 2001). Os genes são sempre genes-em-contexto, dependem dele, e a sua expressão pode ser transformada pelas experiências individuais no curso do desenvolvimento (Champagne & Mashoodh, 2009 apud Meloni, 2014). Ao invés de códigos controladores de uma direção e de um devir desenvolvimental fixo, os genes apresentam-se como catalisadores plásticos da mudança celular (Nijhout, 1990 apud Meloni, 2014).
A epigenética está focada nos mecanismos moleculares de metilação genética, que gravam no epigenoma memórias de experiências sociais e exposições ao meio, passíveis de serem transmitidas ao longo de gerações sem mudanças na sequência de ADN. Ela dá-nos conta da suscetibilidade do cérebro às influências ambientais e aponta para a transmissão intergeracional que ocorre com algumas modificações epigenéticas do seu ADN.
De acordo com a conceptualização tradicional, a formação de um novo embrião decreta o restabelecer (o apagar e o reescrever) do seu epigenoma a partir das informações que estão no ADN, não consentindo a transmissão de alterações fenotípicas. Contudo, verifica-se que, para alguns genes, os marcadores epigenéticos são de facto mantidos e passados de uma geração para a que a segue (Meloni, 2014). Os marcadores epigenéticos, em particular a metilação do ADN, resultam da modificação química deste, capaz de regular a expressão genética passível de ser herdada ou, eventualmente, removida sem mudanças na sua sequência original. Estes marcadores têm vindo a ser reconhecidos como «ideal candidate mechanism for parental effects on phenotypic variation» (Kappeler & Meaney, 2010, p. 818), fenómeno através do qual a exposição de uma geração a determinados estados ambientais pode afetar o fenótipo, mas não o genótipo, da geração seguinte (Badyaev & Uler, 2009 apud Meloni, 2014).
Um estudo de McGowan e seus colaboradores (2009) acerca das marcas epigenéticas do trauma em cérebros humanos de dois grupos de vítimas suicidas, um deles com uma história precoce de abusos, concluiu-se com a existência de níveis mais elevados de metilação de ADN na região reguladora do recetor de glucocorticoides no grupo que sofreu abusos. Neste sentido, serão as experiências traumáticas vividas numa fase precoce da vida, e não o suicídio em si mesmo, que explicam a alteração de metilação de ADN em regiões cruciais do genoma no cérebro (Meloni, 2014). Estes resultados vão ao encontro das conclusões de estudos anteriores e têm vindo a ser aceites enquanto evidência biológica de como as experiências de vida traumáticas ficam embutidas na «memória» do organismo, permanecendo «debaixo da pele» (Hyman, 2009 apud Meloni, 2014, p. 4). Para Hopenwasser (2008), o espelhamento empático e a sintonização dissociativa transcrevem a história de trauma parental para a composição celular da criança, antes ainda da palavra, a montante, pois, de uma narrativa contada.
Parece evidente, e biologicamente observável, que acontecimentos de vida numa fase precoce são passíveis de alterar o estado epigenético de importantes regiões do genoma, cuja expressão pode contribuir para diferenças individuais em termos da propensão para a psicopatologia (McGowan et al., 2009). Gluckman (2011) e os seus colaboradores ( apud Meloni, 2014) falam-nos de fases particularmente plásticas de desenvolvimento, a infância precoce, onde os sinais ambientais estabelecem marcadores epigenéticos estáveis que moldam a suscetibilidade do organismo. Algumas das modificações epigenéticas podem ser mantidas ao longo da vida, havendo outras que são suscetíveis a mudanças posteriores e são reversíveis, pois, sob determinadas circunstâncias (Meloni, 2014).
Meloni (2014) sublinha a importância da constante dialética entre estabilidade e plasticidade do epigenoma. Estabilidade porque se conserva de geração em geração; e plasticidade, entendida de duas formas na sua dimensão social: uma, passiva, referente à capacidade do epigenoma em receber, porque, ao contrário dos genes, é sensível às agressões do ambiente; outra, ativa, no sentido da sua capacidade de dar, de se transformar e melhorar, nomeadamente através de intervenções sociais e terapêuticas.
Quando consideramos as novas variações herdadas como uma resposta ao ambiente, somos levados a ver o meio em que o indivíduo está inserido como um indutor direto das modificações e da novidade evolutiva, como que revisitando o ideário lamarckiano (Jablonka & Lamb, 2005 apud Meloni, 2014; Gissis & Jablonka, 2011 apud Meloni, 2014) e enriquecendo a conceção darwiniana da seleção.
Assim, os recentes avanços no campo da epigenética obrigam-nos a pensar os mecanismos de transmissão transgeracional como fenómenos complexos, multideterminados e pluridimensionais, influídos por variados contextos, inscrevendo-se tanto na psique quanto no soma e esbatendo as fronteiras entre estes. Num contexto em que as mudanças epigenéticas podem ser herdadas e transmitidas às gerações seguintes, «the “nurture” of one generation contributes to the “nature” of subsequent generations» (Kohler, 2012 apud Salberg, 2015, p. 24).
Da análise de diversos autores que aprofundaram a temática da transgeracionalidade, procurámos clarificar nestas páginas os processos psíquicos envolvidos na transmissão dos conteúdos traumáticos ao longo de gerações familiares, refletindo sobretudo nos mecanismos pelos quais a transmissão ocorre.
A incapacidade de mentalizar o traumático e os teores angustiantes encerrados numa relação de vinculação desestruturante aparecem como modalidades de transmissão do vazio e da dor irrepresentável, que encontram forma de se entalhar na expressão genética.
De facto, as recentes pesquisas levadas a cabo no campo da epigenética, parecem reforçar as evidências da continuidade entre o corpo e a mente. A temática é então percebida a partir de uma perspetiva pluridimensional, afirmando a passagem biológica de experiências traumáticas para as gerações seguintes.
Porém, vezes há em que a transmissão transgeracional assenta não apenas na família, mas também, de uma forma mais ampla, em traumatismos sofridos por comunidades inteiras, decorrentes de catástrofes humanitárias, de violências políticas, sociais ou culturais, de guerras ou epidemias. Tanto a humilhação como a conspiração de silêncio sobre o ocorrido desempenham um papel fundamental na ressonância psíquica para a geração sobrevivente e na transmissão para a vindoura. O bebé aparece então, antes mesmo do seu nascimento, como herdeiro do terror traumático murmurado na sua constelação familiar, recipiente prínceps, pois, do traumatismo como herança (Benghozi, 2000).
Benghozi (2000) alerta para um necessário trabalho de prevenção da transmissão geracional do trauma, através da reconstrução dos continentes genealógicos familiares, mas também comunitários. O labor da elaboração das experiências traumáticas das vítimas, dando nome, lugar e corpo a tudo o que não pode ser pensado, dito, simbolizado, é condição capital para a prevenção da saúde psíquica das crianças ainda não nascidas. Quando o trauma é coletivo, esta elaboração deverá fazer-se numa articulação com a instância jurídica, enquanto instituição civilizadora, e com a delimitação dos espaços de cuidados e dos rituais de luto que combatam a morte anónima e a desumanização.
É possível vislumbrar ainda o longo caminho a percorrer na compreensão destes fenómenos traumáticos. Afigura-se-nos de grande pertinência um maior aprofundamento e compreensão do impacto clínico da elaboração de heranças traumáticas e tóxicas, tanto ao nível dos efeitos dessa intervenção na vida dos pacientes, como em termos terapêuticos e preventivos de psicopatologia familiar. Uma inserção social, e até cultural, mais alargada do trauma transgeracional poderá ajudar à sua compreensão no coletivo e à sua ressignificação nos movimentos da história. [7]
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[1] Psicólogo Clínico na SCML. Membro efetivo da Sociedade Portuguesa de Psicologia Clínica (SPPC). E-mail: filipesaramago@yahoo.com
[2] Psicóloga Clínica na Telépsia II – Centro de Psicologia. Membro efetivo da SPPC. E-mail: mariajvabrantes@gmail.com
[3] Psicóloga Clínica na Clínica das Horas. Membro efetivo da SPPC. E-mail: ineslmadureira@gmail.com
[4] Psicóloga Clínica na SCML. Membro efetivo da SPPC. E-mail: anacpalexandre@gmail.com
[5] Professora Catedrática da Universidade Fernando Pessoa. Psicoterapeuta especialista e supervisora científica da SPPC. E-mail: mlencast@ufp.edu.pt
[6] O conceito de Nachträglichkeit foi traduzido para inglês como «deferred action», que atribui um poder causal ao trauma original. A interpretação reconstrói factos empíricos depois do evento (nachträglich), com a intenção de explicar o presente pelo passado. Foi traduzido para francês como «après-coup», em que a interpretação constitui uma tentativa de usar o presente para conferir significado ao passado, depois do evento (nachträglich). Para Dahl (2011), Nachträglichkeit inclui os dois vetores temporais numa relação complementar e circular. O conceito tem tido diferentes traduções em português, como sejam posterioridade, posteriormente, a posteriori, ação diferida e só-depois (Maia & Andrade, 2010).
[7] Artigo elaborado no âmbito do Seminário de Investigação da Sociedade Portuguesa de Psicologia Clínica.